21 de março de 2008

Anna, a francesa ‘frou-frou’ que nos arrebata



Em mais de duas décadas de vida, uma das definições mais bem-humoradas sobre os comunistas foi a que escutei na última quarta-feira. Anna, a little lady de A Culpa é do Fidel (vide imagem), os definiu impiedosamente como “vermelhos e barbudos”. Não tão impiedosamente, afinal foram eles, mais o Fidel, evidente, os culpados pela vida esquisita que a menina, em questão de poucos dias, passou a levar. Esquisita e engraçada na mesma proporção, é o que, nós, espectadores acabamos por concluir. Conclusão esta, preciso dizer, que não chega de mão beijada, mas no momento que deve. E dessa forma, Julie Gavras, a diretora, se apresenta intensa e terna, em dose equilibrada que a conduz muito mais pelo caminho dos acertos.

Inesperadamente, Anna de la Mesa (Nina Kervel-Bey), a garotinha francesa cheia de ‘frou-frous’, olhares e ‘não-me-toques’, precisa administrar a nova rotina, calcada, vejam só, em preceitos comunistas. A casa com o imenso jardim dá lugar a um apartamento apertado, com um quarto a menos. A divisão com o irmão mais novo e barulhento, François, é inevitável. A babá cubana, simpática e dona dos mimos aos quais Anna sempre recorre, é despedida, pois além dos mimos, é a dona das opiniões mais ferozes sobre o comunismo de sua terra pátria. Em substituição, babás estranhas que levam suas esquisitices para as atividades culinárias. Anna não suporta! Mais ainda, sua ausência nas aulas de catecismo do colégio católico hiper conservador, mas para o qual ela é só sorriso. E assim, a cada mudança, a ira de Anna eleva-se a patamares divertidíssimos.

Essa transformação, volto a fita, passa a existir depois que Marie (Julie Depardieu) e Fernando (Stefano Accorsi), pais de Anna, compram a briga de Marga, irmã espanhola de Fernando, que passa a morar na França, após a morte do marido, um militante contra a ditadura de Franco. Parte de um cenário, no qual figuram Fidel, De Gaulle, Franco, Salvador Allende e pensamentos e ações, até então, subversivos, é ótimo que isso na obra de Gavras tenha conseguido ficar magistralmente em segundo plano.

Longe de ser um filme panfletário, “A Culpa é do Fidel”, adaptado livremente do romance Tutta Colpa di Fidel, da jornalista italiana Domitilla Calamai, concebe uma história que pontua principalmente o crescimento – doloroso e abrupto, porém, o que orienta e, em grande parte, define. Tão marcante que nem o Mickey Mouse, “um símbolo fascista do imperialismo”, segundo descreve Fernando, tampouco Papai Noel, barbudo e vermelho, lembrado pelo irmãozinho numa cena deliciosa, hão de duvidar. Anna crescendo é uma das melhores constatações do cinema atual.


A Culpa é do Fidel
(La faute à Fidel, Itália / França, 2006)

Direção: Julie Gavras
Elenco: Nina Kervel-Bey, Julie Depardieu, Stefano Accorsi, Benjamin Feuillet, Martine Chevallier, Olivier Perrier, Marie Kremer
Duração: 99 min.

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