3 de abril de 2008

Muito além do amor



Numa segunda-feira. Ela, uma morena de olhos envolventes, desses que acariciam ternamente sem reserva, lábios inquietos, ventre bem feito e corpo aceso. Ele, um homem de cuja estampa era incomum e os sorrisos demasiados. Ao se aproximarem, numa seqüência em que os sentimentos pareciam estar estupidamente em câmera lenta, voltaram-se um para o outro como se aquela cena fosse fruto de uma imaginação imprudente, um lapso irremediável. Eles se olhavam, como a propor que a intimidade afastada jamais havia sido perdida. Miraram-se como se aquele encontro fosse uma representação de todos os incontáveis encontros que não existiram nos últimos catorze meses. Passou-se, num instante pequeníssimo, muito de uma vida que deixara de ser. A diplomacia pregada ali, inclusive, era um instrumento de defesa, uma pura e ingênua encenação.

Ele quis conferir um tom pessoal à conversa tímida que se estendia. Ela, por sua vez, não seguia adiante da forma que sua vontade, em outras ocasiões, atribuiria. E embora gestos simpáticos lhe fossem peculiares, pouco mais de meia dúzia de palavras eram ditas com certa naturalidade. Nada, porém, poderia evitar a reincidência daquela ordem várias vezes contada em tantas histórias. Viu-a assim, real e próxima, e embaralhada com tanto silêncio. Não havia nada a fazer a não ser aguardar pela espontaneidade que sempre favorece àqueles que amam sem pudor. Seus olhares pareciam, propositalmente, paralisados numa direção em que cruzá-los não seria possível. Em pouco tempo, pois o fato de saberem-se ali lado a lado levavam-nos para o caminho menos equívoco. Sabiam também que todo aquele controle, em segundos, seria posto à prova.

Foi, então, que em pouquíssimos minutos, ele voltou-se para ela e acariciou suavemente seus cabelos negros, que estão sempre a balançar para todos os lados. Sua boca busca seu ouvido para um pequeno segredo. Enquanto ela encaixa o pescoço e repousa seu rosto sobre o ombro dele. Procuraram certamente por outros ombros, mas aquele longo e meticuloso abraço de ternura não enganava nem o mais distraído. Os joelhos a se tocarem e os olhares a percorrerem vagarosamente as expressões, suspeitíssimos de que ali estavam os mais sinceros carinhos. E quando se olharam nos olhos da forma mais intensa, refletiram cada um consigo que eram exatamente aquilo que pensavam um do outro quando o amor se confirmou pela primeira vez.

De repente, com o hálito de vinho francês, que por sua vez sobreleva e exulta, eles se movimentam, se misturam, se confundem, se entregam à ardência e explosão do corpo que voraz ganha som, descem-lhe às entranhas, penetram-lhe os ossos e inundam-lhe por completo. Fecham os olhos como se pudessem prolongar a sensação de prazer, de encanto, de deleite. Era aquela sua amada. Era ele por quem esperara desde sempre. Estavam ali as formas recriadas e ligadas pelo limite inexistente.

Deles restava apenas o eterno grito (...)

[Foto: gettyimages]

9 comentários:

Anônimo disse...

Adoro lê-la. Sou fã incondicional à espera de um livro autografado o mais breve possível.

Unknown disse...

Você está escrevendo como nunca. Suas palavras chegaram a me confortar diante deste período difícil que estou passando. De agora em diante farei do seu blog a minha leitura diária. Parabéns, te desejo todo sucesso. Beijos.

Anônimo disse...

Dá vontade de te xingar. E tudo isso é tão possível, e tão bonito...
E pensar como verdade é tão real e ao mesmo tempo tão estranho...
E dói tanto... mas tanto que chega a dar vontade de abrir o peito pra tirar a dor lá de dentro.

Mas é lindo!
Show! Paranéns!

R. O. disse...

Obrigado pela visita..
Gostei muito do seu espaço também..
Irei acompanhar-te...
pois deste mundo de leitura faço parte.

Bom final de semana...

Anônimo disse...

Acho que o seu texto foi feito para mim............
lindo.....fiquei emocionada!!!

Anônimo disse...

Já adorei!
Que bom! Incrível a descrição dos amantes. Dois universos que se olham...
Saudades. Venha, venha, vai...

Beijinhos,
Gi

Renato Alt disse...

Intenso. Não vejo melhor forma de descrever suas palavras. Nos absorvem, envolvem e conduzem: como só um bom texto é capaz.
Parabéns.

Rafaela Lima disse...

Oi Rê sinta-se a vontade e sempre que quiser visite o tico-tico. Retribuindo a visita li com muita atenção suas linhas e achei meticulosa e belissima a descrição de um puro e verdadeiro sentimento. Parabéns!!! Agora tb estarei por aqui.

Anônimo disse...

Oi, Rê!
Tudo bem?
Já está incluída nas minhas leituras!
Beijos.